domingo, 21 de fevereiro de 2016

As cartas (2ª parte)

_"Mas Dona Hortense, não me diga que o Estevão morreu!"


_" Cala essa boca moça, aí que vergonha, o que é que eu vou dizer á vizinhança, ele não quis vir, ficou lá com uma nativa, com um filho ao colo e outro no bucho."
_" Mas e as cartas, as cartas, eu pensei que o Estevão ia voltar para mim; quer dizer para nós claro, para a familia..."
_" Mas quais cartas moça, quais cartas é tao lerdinha sempre no mundo da lua, o meu filho não sabe ler nem escrever, ou "alembras-te" dele na escola? O meu Estevão não conhece uma letra do tamanho de um boi".
_" Atão, quem me escrevia aquelas cartas tão bonitas tão poeticas?"
_"Quem escrevia as cartas do meu Estevão a dar as novidades era o Julio da aldeia filho do ferreiro."
Maria Rita já não quis ouvir mais nada, pegou na bicicleta e fez-se ao caminho até á aldeia eram 3Km ela tinha de esclarecer as coisas, enquanto pedalava foi arrumando as ideias na sua cabeça, á já dois anos e meio que por arranjinho da vizinha hortense e da sua mãe que ela escrevia ao pobre do Estevão, coitado não tinha arranjado nenhuma madrinha de guerra. A principio fazia aquilo a contragosto obrigada, mas aos poucos, aquele era já um ritual importante na sua vida. Tentava transmitir esperança e força ao seu afilhado de guerra, por sua vez as cartas do Estevão ao principio eram umas dez linhas e contava as paisagens, que graças a Deus tinha escapado a mais uma emboscada. Depois foram crescendo ficando mais carinhosas, mais intensas, ela chegava a corar, e as vezes dormia com elas debaixo da almofada, o seu coração tinha-se enchido de esperança, quem sabe o Estevão desse um bom marido, agora as lagrimas escorriam-lhe cara a baixo. Sentia-se enganada traida, as cartas nem eram dele, pior que isso ele escolheu ficar lá e construir familia. E o Julio, qual era o papel dele no meio disto tudo? As cartas seriam sinceras? Mas que vergonha, que situação levada da breca...Com estes outros pensamentos, Maria Rita chegou á casa do ferreiro e avistou logo o moço, o proprio do Julio, Parou um pouco para o observar sem ser vista, estava mais incorpado, mais homem, decidiu aproximar-se...
_" Boas tardes, disse com os olhos ainda vermelhos do choro, sabe quem eu sou?"
_" Boas tardes,respodeu o Julio, olhando aquele rosto que ainda guardava já manchado e sujo na sua algibeira.
_" Sei bem quem tu és, Maria Rita, filha da Alzira e do Alfredo"...
_" Vim perguntar-te soluçou elá porque escreves-te aquelas cousas todas, porque te fizeste passar pelo Estevão?"
_" Eu não me fiz passar por ninguem, ele pediu-me e eu tive pena de voces"...
_"Aí coitado, tão boa pessoa, penas têm as galinhas, gritou ela"...
_" Não percebes, eu pensava que voces eram noivos, o Estevão é que depois me explicou que tu eras como uma irma para ele; assim eu pensei: Eu tambem não tenho madrinha de guerra, porque não, ela fica madrinha de guerra dos dois, só que depois, depois, o teu rosto o teu sorriso, as tuas palavras bonitas cheias de alegria de esperança aconchegaram-se no meu coração...
Ela olhou para ele, limpou as lagrimas, e disse quase a medo, baixinho:
_" Sabes Julio, se quiseres posso ser mais que tua madrinha de guerra."
Ele aproximou-se, olhou-a fixamente, passou-lhe a mão pelo rosto.
_" Vai para casa Maria Rita, hoje á tardinha passo por lá, para pedir a tua mão aõs teus pais...
BEIJÓCAS LAROCAS DA VOSSA SISSI...