domingo, 30 de junho de 2019

Não tenhas pressa...

Catia tremia, todo o seu corpo protestava, enquanto ela avançava para a beira do penhasco, o mar agitava-se e agigantava-se, quase pressentindo a intenção de Catia em acabar com tudo.
Catia 22 anos, a tentar agradar a tudo e a todos, ótima aluna, ótima filha, ótima pessoa, magra por natureza, e linda aos olhos dos outros...
Chegou ao limite quando ouviu o seu ótimo namorado, adorado por todos, a dizer a um amigo que a traia, claro que sim; Mas não trocava a sua Catia por nenhuma, ela era um vistão, e não era má de todo. Um ano e meio de promessas, de lindas palavras, lindos presentes uma linda ilusão...
Catia soltou um urro, vindo das suas entranhas. que nojo de pessoas, quase todas viciadas na beleza, nas facilidades, nos gagets, ocos por dentro...
O vento brincava com o seu cabelo e com o casaco, e Catia deu mais um passo em direção ao vazio...
Leocádia 33 anos, 1,80 de altura, 85K, a matulona, como lhe chamava o pai, a minha matulona.
Leocádia sempre foi vitima de bullying , pelo seu nome, pelo seu peso, por ser como é, enfim por tudo. A sua sorte era  ser profundamente amada pela sua família, que a educou para enfrentar o mundo com um chicote numa mão e um torrão de açúcar na outra...
Na escola andou várias vezes á pancada, hoje ri-se e até é amiga de alguns dos "combatentes".
Leocádia precisava de respirar, estava a ser um dia difícil, mesmo já adulta e doutorada, era olhada de esguelha; Mas porque??? Que crime é que se pratica por ser-se fiel a si própria, a não ir nas cantigas da sociedade capitalista que nos impinge 50 cremes de beleza por segundo. Caramba é esgotante parece que o seculo 21, quer imitar o 19, mas só no pior...
Ela achava que não tinha de provar nada a ninguém, era honesta trabalhadora, respeitava todos os seres vivos e mortos também. O que é que queriam mais? A perfeição!!!
Fez pisca para a esquerda, para o seu refugio secreto, sarar as feridas e secar as lagrimas, quando estava nos dias mais cinzentos ainda "conseguia ouvir" as vozes esganiçadas, os risinhos, fujam a baleia africana vem aí...
Pois é, mas ela sempre gostou de baleias, por isso pensava: Como diz o meu pai; Pelo menos sou um animal grande e importante, e não uma simples lesma nojenta...
Agora em adulta os ataques eram mais limados mais discretos. Uma antiga patroa, dissera-lhe uma vez;
-"Oh querida, se queres ter sucesso tens de dar um jeito nesse cabelo, usar alguma maquilhagem, e perder alguns quilinhos."
Ao qual Leocádia respondeu: -"Pois felizmente para o meu caso há solução, agora transplantes de cérebro é que ainda não se fazem, mas há que ter esperança...
Bom, perdeu o emprego mas agarrou e protegeu o seu amor próprio feito de carapaça dura.
Parou o carro, admirada por ver outro carro ali parado e vazio. Oh, gaita, queria tanto dar uns gritos sem assustar ninguém, acordar a fera adormecida. Ficou no carro a pensar, o que fazer, mas já tinha feito todos aqueles quilómetros até ali, queria estar junto ao mar, que a acalmava, e aceitava...
Decidiu sair do carro e avançar a zona é muito grande, com sorte não ia ver ninguém, talvez fosse um casalinho secreto...
Catia ouviu um baque, virou o rosto, parecia uma porta a fechar, mas o que interessa, já nada me interessa, tou cansada de ser perfeita, tentar ser perfeita, o peso é tão grande, que me sinto esmagada com tanta expetativa, e agora não quero enfrentar a verdade o fim do meu namoro. A tristeza nos rostos dos pais, o risinho da irmã; -"Mais um que te fugiu Catia? Assim ficas para tia.
Virou o seu rosto choroso para o nada para o horizonte, a ganhar coragem, era só mais uns passos e a dor acabava...
Leocádia avançou direito ao penhasco, começou a distinguir um vulto, o vento trouxe-lhe uma espécie de lamento, mas que raio, apressou o passo, o vulto ganhou contornos femininos, com os cabelos a esvoaçar, á beira do precipício. Leocádia estacou aterrada, mas depois gritou com todas as suas forças:  -"Por favor, não tenhas pressa, a morte há de vir-te buscar"...
Catia assustou-se e olhou para trás, uma mulher grande corria para ela,  os seus joelhos cederam, caiu desamparada na rocha dura...
Leocádia chegou,  ajoelhou-se e abraçou-a.
-"Chora minha querida, chora o que quiseres, mas não tenhas pressa de morrer, fica aqui connosco."
Catia olhou para aquele rosto e perguntou: -"És um anjo?"
Leocádia riu-se.
-" Ah sim, sou um anjo, chamado Leocádia e a partir de hoje se quiseres sou um dos teus anjos da guarda."
Catia quase que sorriu.
-"Que curioso, o teu nome abraça o meu, apenas separado por uma letra, sou a Catia."
E chorou, chorou agarrada aqueles braços cor de chocolate, que a partir daquele momento nunca mais a deixaram cair...

BEIJÓCAS LAROCAS DA VOSSA SISSI...

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